(os três artigos que seguem, foram publicados recentemente no jornal «a ordem», a quem agradecemos a autorização para republicar)
REFERENDAR O VALOR DA VIDA
A Vida humana tem, repito, um valor absoluto em qualquer momento da sua
manifestação concreta: no útero da mãe, na existência real ao longo dos anos e
no período terminal. A Vida é sempre a condição para que a dignidade humana se
possa manifestar e ser respeitada por todos.
Mas será que os cidadãos de Portugal que se declaram cristãos — e andam pelos
90% — dão à vida o valor absoluto que ela exige de todas as consciências?
Um ou mais assassinatos por dia, faça chuva ou faça sol, e quase 20.000
abortamentos praticados em 2010 nos hospitais do SNS, parece indicarem que os
nossos compatriotas não dão à vida o valor que ela merece. Estes factos devem
merecer de todos nós uma ponderação cuidadosa.
O progresso dos conhecimentos científicos sobre os fenómenos vitais dá a
garantia de que, terminada a fecundação, passa a existir um novo ser humano
vivo, único na sua constituição genómica, irrepetível e insubstituível. Uma
preciosidade biológica.
Além de precioso biologicamente, este novo ser vai tornar-se numa pessoa de
capacidades extraordinárias, como a capacidade de pensar e de criar uma cultura
exterior; que pode ser de uma riqueza imprevisível e produzir um bem
incalculável para milhares ou milhões de outras pessoas, por esse mundo fora.
Quando o matamos, matamos todas estas possibilidades.
Está na altura de levar ao conhecimento de todos os cidadãos o modo como deve
ser pensado o valor da vida de cada um, a partir dos dados da moderna ciência
biológica. Numa acção pedagógica que seja respeitadora da liberdade de pensar
de cada um mas que apresente com seriedade e rigor o novo conhecimento sobre a
vida humana.
Depois haverá lugar para um referendo em que se pergunte aos cidadãos qual é o
valor que atribuem à vida humana
Um grupo de cidadãos, independentes de qualquer vinculação política ou
religiosa, está a solicitar à população em geral que subscreva um pedido à
Assembleia da República para que aprove o princípio de se fazer um referendo
sobre o valor que a sociedade portuguesa dá à vida humana.
Muitos milhares de pessoas o irão subscrever, tenho a certeza. Mas esperamos que
as confissões religiosas, sem excepção, vejam neste pedido de dar voz aos
cidadãos, uma forma de concretizar o que todas defendem: a dignidade suprema da
vida humana, a inviolabilidade da vida humana.
* Prof. Jubilado da Universidade do Porto
Da Academia Pontifícia para a Vida
ABORTAMENTO – REFLEXÃO BIOÉTICA
Não há como negar, no plano científico, que abortar um feto em qualquer momento
do seu contínuo desenvolvimento é matar um ser vivo da espécie humana. Que
biologicamente tinha o direito a permanecer vivo e a desenvolver-se no útero
materno como acontece a qualquer ser vivo de todas as outras espécies. Mas na
espécie humana ele é intencionalmente destruído; e se for até à décima semana
de vida será uma banalidade. Em 2010, segundo dados oficiais, cerca de 20.000
seres vivos da espécie humana, portugueses, foram destruídos por decisão das
mães. Com cobertura jurídico-legal e financeira do Governo e com a indiferença
dos cidadãos, ao que parece. A mesma indiferença que manifestam quando lêem a
notícia dos homicídios que todos os dias ocorrem em Portugal, como já lembrei.
Quando, em referendo, se pretendeu saber qual era a opinião dos portugueses
sobre o acto de abortamento de mulher grávida, a resposta de que tal não era
aceitável ganhou por pequena maioria. E não houve Lei de abortamento. Mas 60%
dos portugueses não deram opinião, abstendo-se de votar. Penso que, na sua
maioria, seriam católicos e conhecedores da Instrução Donum Vitae que diz que
ao ser humano, a partir da constituição do Zigoto (embrião de uma célula)
"devem ser--lhe reconhecidos os direitos da pessoa, entre os quais e antes de
tudo o direito inviolável de cada ser humano inocente à vida".
Alguns anos depois, em novo referendo os que responderam que o abortamento até
às dez semanas de vida do feto era aceitável, ganharam por pequena maioria. De
novo ficamos sem saber qual é a opinião dos portugueses porque os mesmos 60%,
certamente católicos, ficaram em casa no dia da votação. E passou a haver lei
de abortamento à vontade livre da mulher, nos hospitais públicos do SNS e em
casas privadas, sem custos para a utilizadora, como se se tratasse de um
cuidado de saúde. Os cuidados de saúde são pagos com os impostos de todos nós
os que trabalhamos e produzimos; mas este uso do SNS não é para um cuidado de
saúde, porque a grávida não está doente; e os médicos que se prestam a cometer
este gesto técnico perverso, atraiçoam o essencial da sua profissão.
Como havemos de saber qual é a opinião maioritária dos portugueses?
Voltarei ao tema.
* Prof. Jubilado da Universidade do Porto
Da Academia Pontifícia para a Vida
NÃO MATARÁS
Moisés, o fundador da Tradição Hebraica, recebeu de Iavé o mandamento essencial
para a salvação dos Homens — não matarás. Tudo o mais vem depois.
Cristo acrescentou-lhe o mandamento do amor — amarás o teu próximo como a ti
mesmo.
Então, hebreus e cristãos não podem ser homicidas e devem ser amigos de todos os
homens porque de todos somos irmãos. Em Iavé que nos criou e em Cristo que nos
amou e redimiu.
Mas o que é que vemos num País cujos habitantes se declaram católicos em grande
maioria e que é tido como um lugar seguro para quem nos visita? Vemos que todos
os dias, sem excepção, um ser humano mata outro ser humano, de forma cruel e
desumana, algumas vezes na frente de filhos menores ou de familiares idosos.
Estes homicídios são relatados nos jornais diários com a maior indiferença ética
e dando relevo a pormenores escabrosos descritos como se fossem banais ou
normais: regou-a com gasolina, acendeu o isqueiro, deixando-a amarrada a uma
árvore, a arder, e foi ao café beber uma cerveja...
Muita gente lê, encolhe os ombros e acha que é assunto para a GNR, ou a PSP, ou
a PJ. Não lhes diz respeito!
Será que a cultura de morte está instalada nas nossas mentes e nada queremos
fazer para a substituir por uma cultura de vida?
Será que ficamos indiferentes à morte do homem pelo homem, o mais grave pecado
do Homem contra Deus?
Não pode ser. É preciso acabar com esta indiferença e assumir que o primeiro
dever dos Cristãos, todos, e em especial dos Católicos, é lançar um movimento
para educar uma nova geração de jovens que sejam jovens amantes da paz e que
nunca serão capazes de matar o seu semelhante, o seu irmão. Há uma Pastoral da
Paz a desenvolver, já.
A brutalidade — não é bullying, é brutalidade — nas Escolas, entre
pré-adolescentes e adolescentes cruéis, que se agridem com violência e filmam
as agressões para se gabarem do seu comportamento execrável, não pode ser vista
com benevolência e classificada de brincadeira sem importância. É nesta
violência gratuita que se estão a criar os futuros assassinos.
A Família, até mais do que a Escola, é chamada a uma vigilância activa e
permanente para que não aconteça que um dia vá buscar o seu filho, morto, ao
fundo de um rio.
Voltarei a este tema porque a indiferença face a esta escalada da cultura da
morte exige uma rápida acção de todos nós.
* Prof. Jubilado da Universidade do Porto
Da Academia Pontifícia para a Vida